domingo, 31 de agosto de 2008

BELOS E MALDILTOS


Belos e malditos, segundo romance de F. Scott Fitzgerald (1896-1940), é um devastador panorama dos excessos e loucuras da Era do Jazz, e uma representação autobiográfica de um glamoroso e irresponsável casal de Manhattan e seu espetacular e trágico declínio. Publicada logo após Este lado do paraíso (romance de estréia do autor), a história de Anthony Patch, herdeiro milionário formado pela Universidade de Harvard, e Gloria, sua mulher, reflete toda a força da intensa e romântica imaginação de Fitzgerald e atesta sua maturidade técnica e emocional.Este livro é, a um só tempo, um conto moral, uma comovente meditação sobre amor, casamento e dinheiro, além de um acurado documento social, escrito por uma das principais vozes da ficção norte-americana do século XX.

AINDA O CASO DA TORTA


Nunca é demais tratar-se de assuntos ligados aos interesses da coletividade, mormente aqueles que dizem respeito ao setor de alimentação, no caso a nossa pecuária leiteira. Essa matéria jamais deixou de ocupar espaço nos jornais da terra abordando problemas que já se eternizaram relacionados com a alimentação do gado de estábulo que fornece o leite, um dos principais alimentos do povo.
Referimo-nos ainda ao caso da torta de algodão, quanto à sua qualidade em teor protéico. O deputado Fausto Arruda, da bancada do MDB na Assembléia Legislativa, denunciou, da tribuna daquela Casa, o crime que está sendo perpetuado contra a pecuária cearense. Os prejuízos decorrentes de tal cometimento são bivalentes em toda a extensão. Por um lado, como observou o deputado fausto Arruda, tira o ânimo e incentivo do pecuarista para manter vacarias em tais circunstâncias, levando-se em conta o aumento da ração em virtude do baixo teor de proteínas, aumentando, conseqüentemente, o consumo em volume e a despesa: por outro, esta alimentação ministrada ao gado não pode fornecer um leite com todos os nutrientes desejados e próprios do produto, tendo em vista a qualificação dada pelo Deputado denunciante de que se trata de adubo com solvente.
Leite é o alimento apropriado para crianças e velhos, cujos organismos, dadas as faixas etárias de ambos, são por demais delicados e, por esta razão, faz-se necessário um alimento de boa qualidade, sem se falar da saúde do próprio animal com este tipo de torta.
Não faz muito, a imprensa veiculou notícia sobre poluição do leite comercializado em Fortaleza, especificando até os tipos de ingredientes adicionados ao produto. O pior é que as irregularidades são apresentadas, vêm as “explicações “, porém, os responsáveis pela coisa ficam por baixo do pano preparando-se para outras investidas na busca de maiores lucros em detrimento da saúde daqueles que consomem a sua mercadoria.
Espera-se que os setores competentes do Governo adotem medidas para coibir tais abusos, que há muito se tornaram rotina.
CORREIO DO CEARÁ – 29/08/1977

A CRÔNICA DO ABUSO

Abud abriu os olhos. Havia um homem de costas para ele, sem nenhuma roupa, que exasperado, parecia falar ao telefone. Tentou sair de onde estava e percebeu que estava atado com correntes a um estrado de madeira. O corpo todo lhe doeu quando fez outro esforço. Aos poucos, sua visão foi se acostumando com o ambiente e descobriu, enfim, onde estava. Viu os cadeados que lhe prendiam às correntes e ao estrado. As travas de madeira que lhe tolhiam os movimentos das pernas. As presilhas de ferro nos dedos dos pés, como se fossem anéis parafusados na madeira, rasgando a carne. As algemas nos tornozelos que se fechavam a cada movimento. Moveu um pouco a cabeça para um lado e descobriu que também havia um colar de ferro que lhe apertava o pescoço por meio de um parafuso. Tentou falar, mas o colar de ferro lhe sufocou mais ainda. Os lábios estavam em carne viva. Sentiu sede e fome.— Enfim acordou, o meu menino! – o homem que ele havia visto sem roupas, agora vestido, se aproximou com uma jarra d’água. Deu-lhe de beber à vontade. - “Se você tomar da água que eu lhe der jamais terá sede, eu vou preencher o vazio de sua vida para sempre.” – sorriu, e acrescentou: — Posso lhe dar a liberdade ou a morte, mas antes, poderá escolher um alívio. Quer que eu tire as algemas, as correntes ou a "Forquilha do Herege", o colar de ferro dos negros fujões? Os olhos de puro terror de Abud não viam senão o carrasco. Tentou falar, o colar rangeu entre parafusos.— Ah, o colar! Quer que eu tire o colar? – o homem aproximou-se e, com uma chave de fenda e um alicate, arrancou-lhe os parafusos, lentamente, um a um, numa seqüência interminável. — Escolheu bem. Assim podemos conversar. “Quando te vi amei-te já muito antes: Tornei a achar-te quando te encontrei. Nasci pra ti antes de haver o mundo. Não há cousa feliz ou hora alegre que eu tenha tido pela vida fora, que o não fosse porque te previa, porque dormias nela tu futuro”...— Conhece? “A Falência do Prazer e do Amor” de Fernando Pessoa. Já leu Fernando Pessoa?— Não... – balbuciou. Deixe-me sair...— Imbecil! Que quer lá fora, se tem tudo aqui dentro, inclusive a mim?! Posso matá-lo agora mesmo, se eu quiser. Não me tente! Desconfio que não me deseja mais.O terror invadiu a pobre alma de Abud e ele entoou uma oração de quando era menino... ”santo anjo do Senhor, meu zeloso guardador...” e lembrou-se bem daquele homem. Trabalhava na mesma repartição pública que ele e já o tinha visto algumas vezes nas reuniões e nas festas de aniversariantes. Todos o tratavam por Sr. Ormuz. Do tipo persuasivo, manipulador, tinha o olhar inquietador, lembrava Grigory Rasputin. Abud fizera amizade com ele e aos poucos ele já o tinha dominado ao ponto de serem vistos sempre juntos. Almoçavam sempre juntos. Ele lhe emprestava dinheiro sempre que precisava e nunca aceitava que lhe pagasse. Conversavam horas sobre quase tudo, confidências, livros, filmes e Abud julgava estar aprendendo bastante com aquele homem. Sr. Ormuz gabava-se de nunca ter faltado ou chegado atrasado um dia sequer, em 18 anos de serviço. Chegava sempre antes de todo mundo e saía tarde da noite. Nunca tinha ficado doente e nunca havia se envolvido sentimentalmente com qualquer funcionário, até conhecer Abud. Até conhecer Abud.— Está a faltar ao trabalho, Abud. Não tenho mais justificativas a dar. Você está se saindo um péssimo funcionário. Um péssimo exemplo para os colegas. Não tenho mais justificativas a dar. Falei há pouco com o setor de RH e perdi até a paciência com eles, o que dificilmente deixo acontecer.— Quanto tempo?... Perguntou num fio de voz, num fio de voz.— Duas semanas, já. Não se lembra? Maldito!Abud empalideceu mais ainda. ”santo anjo do Senhor, meu zeloso guardador...” Ele havia estado refém do Sr. Ormuz durante duas semanas. Como ele teria chegado até ali, ele não lembrava por mais que tentasse. As correntes se contorceram no corpo de Abud, os cadeados e as algemas se fecharam mais. Os parafusos soltavam grunhidos. As travas das presilhas se apertaram. A dor e a vergonha e o medo cingiram-se em Abud. A cela em que Abud se encontrava preso estava escura, úmida, suja e havia correntes, cadeados e pregos nas paredes. Ganchos e arpões pendiam enferrujados. No canto, havia caixotes de madeiras, baratas, caixas e jornais velhos entulhados.Mas, havia ainda, uma coisa que Abud não via e ninguém via: um anjo, a um canto, em meio aos entulhos, triste, acabrunhado de dor. Quem olhasse não veria nada além de uma sombra no canto. E o anjo recitou um poema no ouvido de Abud, tão baixo... tão baixo...— Quanto a mim... – disse o Sr. Ormuz – Tenho que ir. Não posso me dar ao luxo de faltar ao trabalho. Quando eu voltar, podemos conversar mais um pouco...— Espere... – suspirou Abud. As correntes se retorciam de dor e vexame. – tenho uma coisa a dizer...importante...— E o que pode ser...? – desdenhou.E Abud recitou o poema, tão baixo... tão baixo...— Oh, meu Deus! Oh, meu Deus! O que disse? - Sr. Ormuz repentinamente se descompôs em prantos e medo e dor.E Abud, outra vez, recitou o poema, tão baixo... tão baixo...— Oh, meu Deus! - Sr. Ormuz caiu aos pés de Abud, com as mãos em penitência - O que disse? - Abud empalideceu outra vez. Os cadeados e as correntes mordiam sua carne. O colar de ferro não lhe deixava ver o que acontecia. Ouviu o tilintar de chaves e ferramentas entrecortado pelos sobrenaturais gemidos de choro e o ranger de dentes do Sr. Ormuz.— Temos que ir ao hospital! Você está em péssimo estado! Oh, meu Deus! – O homem visivelmente transtornado começou então a manejar as ferramentas e as chaves de fenda, arrancando os parafusos e as presilhas e os cadeados e as correntes e as travas...— Temos que ir ao hospital! Dizemos que foi atacado por um cão feroz. Que acha? – O homem freneticamente arrancava-lhe os parafusos, as travas e os cadeados, um a um, numa seqüência interminável.— Sim... um cão feroz. – balbuciou atônito, Abud. - um cão feroz...Abud abriu os olhos. Percebeu que estava em uma enfermaria. Uma enfermeira aplicou-lhe alguma coisa no braço. Ajustou o soro.— Você teve sorte, rapaz. Poucos escapam de um cão feroz. – falou-lhe entre sorrisos. — Você chegou inconsciente. Graças ao distinto senhor que lhe trouxe aqui, tivemos tempo de reanimá-lo. Um milagre!Abud virou o rosto e olhou para um canto do quarto. Pensou ter visto uma sombra. Mas estava muito cansado para pensar. No entanto, havia uma coisa que Abud não via e ninguém via: um anjo, a um canto. Quem olhasse não veria nada além do que parecia ser uma sombra... E o anjo disse alguma coisa no ouvido de Abud, tão baixo... tão baixo...— Acabou... acabou...Na repartição, onde trabalhava Abud, todos estranharam além de tudo isso, o fato de que, em 18 anos, pela primeira vez, o Sr. Ormuz faltara ao trabalho.
Conto agraciado com a 19ª colocação no Prêmio de Literatura Unifor , na categoria Contos Inéditos.

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Aos Educadores Publicos do Brasil !

Gostaria de saber o porque não se faz uma revolução na educação de nossas crianças, sabemos que o ensino de hoje deixa há desejar, pois os quadros de algumas escolas particulares estão bem a cima da media, o colégio público esta, diz cope falar, mais pessimamente representado pelos professores desatualizados que estão nas matérias que lecionam ou então, estão totalmente despreparado para um bom desempenho profissional, solicito também aos Srs do ensino um estudo mais aprofundado no destaque para um colégio ou um especial um ( prédio) ou para alguma classe que seja formado por alunos com mais preparo psicológico intelectual para que estes possam se formar no seu andamento com mais rapidez não havendo atrasos pelos companheiros que com eles caminhão, isto não é um fato de haver uma descriminação do ser humano e sim diferenciadas que elas são.Grande abraço há todos educadores e que nosso ensino seja revolucionário.

Dna Tereza Porto
Secretaria da Educação R.J.

Newton Silva no Livro dos Políticos

O cartunista Newton Silva (Zoeira), foi convidado pela Ediouro para participar, entre outros cartunistas brasileiros, no Livro dos Políticos (Almanaque) de Heródoto Barbeiro e Bruna Cantele, com lançamento dia 4 de setembro, às 17:30hs, na Livraria Cultura - Av.Paulista. São Paulo.
Os autores:
Heródoto Barbeiro é jornalista e escritor, âncora do Jornal da CBN e do Jornal da Cultura. Nasceu em São Paulo.
Bruna Cantele é mestra em educação, historiadora, autora de livros didáticos e paradidáticos, além de coordenadora do Departamento de Historia de colégio particular em São Paulo.
Newton Silva tem que estar postado entre os grandes porque na minha opinião ele é um dos melhores do Brasil. Valeu Newtão!!

terça-feira, 26 de agosto de 2008

A Globalização no Mundo !

A Globalização dos que governam o mundo no planeta terra seguem doutrinas pagãs doutrinas egoístas perversas no sentido único da exploração indecente dos povos tornando-os estes escravos das paixões inflamadas no controle da humanidade através do poder que lhes são dados através da sociedade que os elegem, cegos muitos deles são, este tipo de globalização onde destrói e depois une nunca ira prosperar para a estabilidade mundial, estamos assistimos e vivemos dias confusos, doutrinas pelo governo único eles trabalham, no silencio da noite eles prosperam, mais não dão o sentido ao progresso dos povos, eles não trazem a paz consigo como poderão trazer o progresso para o mundo, escarnecedores muitos são no desequilíbrio dos povos tornaram, marcados muitos serão e pelas doutrinas pagãs seguirão, dizem com todas as palavras enganadoras para o progresso mais por trás trazem lagrimas e destruição da própria carne, extraindo o sangue dos santos vão, embebedando-se através do MAL sequem. Malditos são e pro lago do enxofre irão, confundidos não serão.
(Ricardo ª Filgueiras)

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

MEU CONTO "CITIES IN THE SKY"


CITIES IN THE SKY
Nelson Silva

Por essa época, todos os conflitos militares entre nações haviam cessado completamente nos quatro cantos da Terra. Embora atentados terroristas continuassem a sacudir grandes cidades da Europa e dos Estados Unidos sem retaliação aparente, guerras travadas por estados devidamente constituídos era coisa que não se ouvia falar haviam duas dúzias de anos.
Sob este prisma, como se poderia supor, o mundo definitivamente achava-se desfrutando de um período sem precedentes em sua história. Uma era em que, finalmente, o insólito astro azul não se encontrava empapado em sangue.
Tal convicção não soaria absurda de todo, uma vez que os orçamentos militares das superpotências haviam sido suprimidos drasticamente. Gastos com armamentos simplesmente desapareceram da mesa de negociações de governantes declaradamente belicistas.
Inimigos ancestrais - políticos e religiosos - selavam a paz e assinavam acordos de cooperação mútua onde antes só havia ódio e intolerância milenares.
Restavam combates étnicos isolados e homens-bomba que efetivamente explodiam aqui e ali, mas já nem mesmo eles sabiam bem porquê estavam indo pelos ares.
A estranha ausência de hostilidades acabou convencendo até aos analistas mais céticos, defensores da teoria do ovo da serpente, aquele que eclode em ‘inocentes’ períodos de paz, como sucedera após o entreguerras de 18-39.
Circunstâncias históricas à parte, a nova era mostrava-se promissora, uma vez que as fabulosas quantias que nutriam a máquina da guerra podiam enfim ser empregadas em causas bem mais nobres, negligenciadas que foram pelos incontáveis mensageiros da morte que conduziram a civilização humana em sua tenebrosa trajetória através dos tempos.
O axiological dream world de Morus, a sociedade equilibrada e perfeita aparentemente tornara-se palpável para a maioria da população terrestre.
Foi então que passou-se a exigir do G-7 investimentos maciços em produção de alimentos, construção de moradias e escolas, pesquisa e fabricação de remédios empregando os bilhões de dólares que antes financiavam o aparelho bélico e irrigavam as veias dos vampiros das trevas que insistiam em sujar de sangue as páginas da história.
Falava-se mesmo em erradicação da fome, da miséria e de muitas doenças, do controle eficaz de todas as epidemias e da igualdade social entre os povos como algo perfeitamente possível de se realizar e em um intervalo de tempo relativamente curto.
Curioso pois, era observar a misteriosa apatia dos líderes que conduziam os países mais abastados, em nítido contraste com o entusiasmo global. Também requeria um traço de suspeição se fossem levadas em conta suas constantes evasivas quando interpelados sobre a aplicação destes recursos em um plano de paz mundial tão ansiosamente aspirado.
O mundo não tardaria a descobrir, contudo, o que estava por trás das enigmáticas fisionomias de reis, presidentes, ditadores, primeiros-ministros, senhores do capitalismo e chefes de religiões.
Reunidos em uma assembléia na ONU e sob protestos veementes dos representantes das nações mais pobres, eles surpreenderam a humanidade ao revelar um segredo de estado que estava sendo gestado há anos: um gigantesco projeto que iria consumir bem mais do que apenas o orçamento de suas forças armadas e conter toda aquela fábula de sociedade perfeita.
Uma espetacular estação espacial com dimensões estapafúrdias de centenas de quilômetros em fase final de construção há tempos pairava sobre o planeta, naquela que seria a maior aventura tecnológica da espécie.
A novidade causou alvoroço e incredulidade nos outrora entusiasmados articuladores do chamado “Really Peace” ,que era como o movimento em prol da nova era ficou conhecido.
Todos os grandes conglomerados industriais concentraram seus esforços para suprir as necessidades do voraz monstro espacial, suspenso na estratosfera, a doze mil quilômetros de altitude.
Visível a olho nu, a estrela metálica, com seu arrogante brilho prateado, remetia a um cometa portador de mau agouro, conforme acreditavam os anciões das tribos primitivas na infância da civilização. E, como se sabe, corpos celestes travestidos de deuses estavam sempre a exigir um ritual de sacrifício humano.
Logo, tudo o que o mundo produziria a partir dali embarcaria nos foguetes que partiam, céleres, para a estranha estrutura cósmica. O projeto inicial há muito fora expandido e os limites da estação pareciam convergir aos confins do universo.
Paralelamente às rotineiras decolagens das aeronaves, fatos intrigantes se desenrolavam na superfície.
Os estados há muito haviam abdicado de seus intrínsecos papeis fundamentais. O poder constituído isolara-se em torno de si e uma feroz instituição policial foi implantada, protegendo os governos e punindo com a morte toda e qualquer insurreição popular.
Uma grande parcela de trabalhadores fora aglutinada em áreas fechadas ou em campos de trabalhos forçados – que em muito lembravam a política do Gulag soviético – com o fim de produzir alimentos e um sem-número dos mais variados artigos, que eram rapidamente levados à NASA e às bases do Casaquistão, de onde embarcavam em ônibus espaciais em direção ao arranha-céu estelar, a essa altura já habitado por centenas de pessoas.
Um enorme elevador espacial – um cabo feito de fibra de nanotubos de carbono com uma força de tensão essencialmente alta – estendia-se por mais de vinte e cinco mil quilômetros espaço adentro, fixado em satélites geoestacionários, permitia que carregamentos, passageiros, contêineres e cargueiros de provisões contendo sementes de plantas, árvores e gêneros alimentícios desenvolvidos sob medida pela engenharia genética fossem içados para fora da gravidade terrestre com energia fornecida do solo. O resto da viagem era realizado por um foguete nuclear de baixa propulsão até o desembarque final no inacreditável aparato sideral.
Com a informação sob controle não era possível saber o que raios estava acontecendo. Comentava-se que os cientistas haviam descoberto uma nova forma de sobrevivência no espaço e, para viabilizar as pesquisas, estavam convidando os poderosos e a elite mundial para vivenciar a extravagante experiência, desde que desembolsassem, obviamente, uma quantia de muitos milhões de dólares.
À medida que reis, rainhas, presidentes e magnatas citados na Forbes começaram a ascender aos céus em vôos espaciais diários, a mentira oficial começou a ruir como um castelo de cartas. Apesar da tenaz repressão aos órgãos de comunicação, sobretudo na rede mundial de computadores, alguns heróis mártires – como aqueles que se opuseram ao Führer na aurora do III Reich – conseguiram denunciar a farsa e suas imagens clandestinas não deixavam dúvidas de que havia uma fuga em andamento, embora muitos deles tivessem que pagar com a própria vida a descoberta sem precedentes nos anais de nossa epopéia.
De que fugiam afinal, os dirigentes mundiais? Era a retumbante pergunta que se fazia.
Os semblantes aparvalhados dos desertores, metidos em ridículas roupas de cosmonautas lembravam condenados subindo ao patíbulo, revelando uma notória apreensão, como se não tivessem certeza do seu destino.
Quando o Papa e seu séqüito tomaram assento em um desses veículos espaciais, ficara evidente que um perigo iminente rondava a Terra.
As miseráveis criaturas repudiadas estabeleceram, cá embaixo, um sistema em que prevaleciam saques, linchamentos, suicídios e um amplo leque de atrocidades. Não pareciam capazes de estabelecer uma organização com o risco de um fim iminente.
Há muito haviam sido julgados por seus líderes. Restava agora saber de que forma de morte morreriam. E se existia alguma chance de sobrevivência.
Por enquanto, estavam absorvendo o choque da forma mais humana possível: a da guerra contra o seu semelhante.
No alto, a estrela artificial cintilava, patética e reluzente.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Prêmio de Literatura Unifor

Conheça os vencedores da edição de 2007

O Prêmio de Literatura Unifor divulgou nesta quarta-feira, 13 de agosto, os vencedores da edição de 2007. Conheça abaixo os premiados:Obra inédita:Fernando Antônio Siqueira “Ao Lado do Morto”
Trabalho inédito:1º Carmélia Maria Aragão “O Gato de Alice”2º Sebastião Valdemir Mourão “Túmulo Quadrado Morno”3º Antônio Weimar G। dos Santos “O Retrato”4º Ricardo Guilherme V। dos Santos “InMaria”5º Emanuel Oliveira Braga “A Última Herança”6º Nathália Costa Bernardo “Ela”7º Ana Carolina Bomfim Jacó “Soledades”8º Carlos Roberto N. de Vasconcelos “Perdas e Danos”9º Jesus Irajacy F. da Costa “Súplicas de um Livrinho Esquecido”10º José Cavalcante Fonteles “A Chave do Absoluto”11º Glauco Sobreira “O Abismo”12º José Dimas de Carvalho Muniz “Tlön, Uqbar, Orbis Tertius”13º NEMÉSIO DIAS SILVA FILHO “ÁTILA”14º Ana Cleia Jerônimo Holanda “Recomeço”15º Lucíola Limaverde Ribeiro “Salto”16º João Matias de Oliveira Neto “A Dedo”17º Sara Rejane Oliveira “Quando o Inesperado Bate á Porta”18º Antônio Mendes Carneiro Jr. “Laranja”19º NEWTON DIAS SILVA “A CRÔNICA DO ABUSO”20º Pedro Jucá de Oliveira “Um Desejo”


O prêmio contempla duas categorias: Obra Inédita, que tem como premiação uma viagem a Washington para visitar a Biblioteca Nacional do Congresso Americano, além da publicação da obra (400 exemplares); e Trabalhos Inéditos, cuja premiação será, para o autor classificado em 1º lugar, uma viagem ao Rio de Janeiro para visitar a Biblioteca Nacional e, para os autores classificados entre o 2º e o 20º lugar, a publicação de seus trabalhos em uma coletânea. Mais informações pelo telefone (85) 3477.3239.

O profissional de moda e o mercado



Tânia Neiva


Para atuar como designer de moda é preciso ter uma sólida formação profissional e muita cultura. É imprescindível ter conhecimento do contexto histórico da moda, conhecer o mercado a fundo, observar os rumos da economia e do comportamento de consumo dos consumidores nos variados nichos. O estilista não deve se concentrar somente em coletar informações superficiais sobre tendências de formas, detalhes e cores, mas também deve ser capaz de ver e identificar as mudanças sócio-econômicas que interferem no ambiente à sua volta.
Pesquisas, muita leitura e interesse nos mais variados assuntos são necessários. O trabalho intenso está muito mais presente na rotina do estilista do que os devaneios da criação, pois estes são uma pequena parcela do processo criativo. Assim como Sue Jones afirma que os criadores de moda não devem confiar na intuição. Pesquisas atentas e capacidade de ler os sinais das mudanças são o ponto de partida para qualquer criação e para realizar um bom negócio, e colocarão você na dianteira do jogo.
O trabalho de um estilista dentro de uma empresa seja esta pequena, média ou grande, não deve se limitar ao desenho de modelos novos e preenchimento de fichas técnicas. O estudante recebe muito conhecimento durante a sua formação e limitar-se só a essas atividades é subestimar a sua capacidade de realizar um trabalho mais completo de identificação do seu público-alvo, intensificação da comunicação com este e conseqüente fortalecimento e solidificação da marca no mercado.
Segundo estatísticas do SEBRAE Ceará as vendas de roupas no varejo brasileiro somaram cerca de R$ 74 bilhões em 2007, um aumento de 7% em relação ao ano anterior. Com este crescimento a indústria de confecção torna-se cada vez mais segmentada conforme o estilo de roupa ou o perfil do público. Esta segmentação exige um profundo conhecimento do público-alvo em um verdadeiro mergulho em seu universo. Apenas pesquisar tendências de moda massificadas não é mais suficiente neste novo cenário, pois os consumidores sabem muito bem o que querem comprar.
Aqueles profissionais que estão viciados em copiar os modelos dos catálogos de seus concorrentes estão com os dias contados, assim como as empresas que exigem essa prática de seus profissionais. Estas estão subaproveitando um profissional capaz de oferecer muito mais para o crescimento da empresa e os profissionais que se sujeitam a esta prática ficam mal visto em todo o mercado como limitados e medíocres.
Quem possui imaginação sem conhecimentos tem asas, mas não pés. (Joseph Joubert - ensaísta francês – 1754-1824)
Referências:Jones, Sue Jenkyn. Fashion design: manual do estilista. São Paulo:Cosac Naify, 2005.


Iniciou sua atuação como desenhista de moda em 1997।É graduada em Estilismo e Moda pela Universidade Federal do Ceará e especialista em Metodologia do Ensino de Artes (UECE). Atua na área de planejamento de criação de coleções de moda e é professora da faculdade de moda (UFC) desde 2005.

sábado, 16 de agosto de 2008





FLORBELA ESPANCA UMA MULHER ALÉM DO SEU TEMPO

Florbela Espanca foi uma das maiores poetisas da língua portuguesa. Nasceu em 8 de dezembro de 1894, na pequena Vila Viçosa, Alentejo. Filha de José Maria Espanca e de sua concubina Antonia da Conceição Lobo, é fruto fora do casamento do pai devido à impossibilidade da esposa lhe dar filhos, o que o faz recorrer a uma velha lei medieval de tê-los fora do casamento. Ainda com Antonia, o pai de Florbela tem outro filho, Apeles. Florbela é batizada pela própria esposa do pai e mais tarde, criada por ela.É de uma personalidade passional e apaixonante. Herda do pai o amor pela fotografia, José Maria Espanca é quem introduz o cinematógrafo em Portugal. Freqüenta o ensino secundário em Évora, e mais tarde o curso de Direito, o que é visto como um ato de ousadia para uma mulher de sua época. Mas a ousadia faria parte para sempre da sua vida e da sua obra.Os poemas de Florbela Espanca transportam o leitor para agudeza das palavras e do amor, sôfrego e passional, mas de uma beleza intensa que nos devora a alma, que nos faz sentir que corre o sangue da vida em nossas veias. A poesia de Florbela traz a vida, os sentimentos à flor da pele. A coragem de amar e de expor-se aos sentimentos, sem medo da sua condição de mulher e da época que a gerou. Florbela desafia o seu tempo. Está além dele, além das limitações que lhe são impostas. Tem a coragem de amar uma, duas, várias vezes. Casa-se por três vezes, o que cria a rejeição e animosidade da sua família tradicionalista, que lhe deixa de falar por algum tempo.Há quem a acuse de amar o próprio irmão Apeles. Esse amor impossível e incestuoso lhe teria arrancado os mais tórridos poemas. Verdades ou lendas, o fato é que quando Florbela perde o irmão em 1927, morto em um trágico acidente, jamais se irá recuperar psicologicamente. Entra em estado permanente de depressão, fuma em demasia e vai perdendo o brilho e a saúde, cada vez mais abalada psicologicamente. Mergulha em um estado de solidão que a faz distanciar-se cada vez mais da paixão pela vida. Na passagem da noite de 7 para 8 de dezembro de 1930, dia do seu aniversário, Florbela Espanca põe fim à sua agonia perene, suicida-se ingerindo dois frascos de Veronal. Aos trinta e seis anos cala-se para sempre esta poetisa portuguesa que fez da sua poesia uma ode perene ao amor e à paixão.Um Poema de Amor
AmarEu quero amar, amar perdidamente!Amar só por amar : Aqui... Além...Mais Este e Aquele, e Outro e toda a gente...Amar! Amar! E não amar ninguém!Recordar? Esquecer? Indiferente! ...Prender ou desprender? É mal? É bem?Quem disser que se pode amar alguémDurante a vida inteira é porque mente!Há uma Primavera em cada dia:É preciso cantá-la assim florida,Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!E se um dia hei de ser pó, cinza e nadaQue seja a minha noite uma alvorada,Que me saiba perder... pra me encontrar...
Outro Poema
Ser Poeta (Perdidamente)
Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!
É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!
É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!
E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!
CRONOLOGIA1894 – Nasce, em 8 de dezembro em Vila Viçosa (Alentejo), Florbela d’Alma da Conceição Espanca, filha de Antônia da Conceição Lobo e João Maria Espanca, casado com Mariana do Carmo Ingleza.1895 – è batizada em 20 de junho de 1895, tendo como padrinhos Mariana do Carmo Ingleza , esposa do pai e como padrinho o amigo Daniel da Silva Barroso.1897 – Nasce o irmão Apeles em 10 de março.1899 – Florbela freqüenta a escola primária em Vila Viçosa.1903 – Data de 11 de novembro o poema “A Vida e a Morte”, provavelmente a primeira peça escrita por Florbela.1908 – Ingressa no Liceu de Évora, onde permanece até 1912, de modo que a família muda-se nesse ano para Évora, a fim de facilitar-lhe a permanência nos estudos. Ainda em 1908, falece em Vila Viçosa a sua mãe Antônia da Conceição Lobo, aos vinte e nove anos de idade.1913 – Florbela batiza, em 8 de maio, o primo Túlio Espanca, a quem se dedicará sempre com desvelos de assídua madrinha. No dia do seu aniversário, casa-se em Vila Viçosa, com Alberto de Jesus Silva Moutinho, um ano mais velho que ela, seu colega desde o primário.1914 – Florbela e o marido vão morar no Redondo; ali atravessarão um período econômico difícil, já que se sustentam dos parcos rendimentos das aulas particulares a alunos de Colégio.1915 – O jovem casal regressará a Évora, para viver em casa de João Maria Espanca e para dar aulas no Colégio de Nossa Senhora da Conceição.1916 – Florbela seleciona, dentre a sua produção poética cerca de trinta peças produzidas a partir de 10 de maio de 1915, com as quais inaugura o projeto e o manuscrito Trocando Olhares. Começa a partir de princípio de junho, a se ocupar de um novo projeto poético, A Alma de Portugal. Após 18 de julho, envia a Raul Proença, a sua antologia Primeiros Passos.1917 – Encerra o manuscrito Trocando Olhares em 30 de abril desse ano.Apeles, que tem dotes artísticos e que pratica sensivelmente a pintura, está seguindo carreira oposta em Lisboa: em 19 de agosto, termina o Curso da Escola Naval, graduando-se aspirante.Em 9 de outubro, Florbela, vivendo desde setembro em Lisboa, subsidiada pelo pai, matricula-se na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, que abandonará em meados de 1920.1918 - Em abril, Florbela que se encontra adoentada, vai com o marido a Quelfes (Algarve) para repouso.1919 – É publicado em junho, pela Tipografia Maurício de Lisboa, O Livro de Mágoas.1921 – Apeles é graduado guarda-marinha pela Escola Naval. Em 30 de abril é decretado, em Évora, o divórcio de Florbela com Moutinho. Em 29 de junho, Florbela se casa com o alferes de artilharia da Guarda Republicana, Antônio José Marques Guimarães, então com 26 anos, o casal vai residir no Porto.1922 – Transfere-se, em março, para uma Quinta na Amadora e, já em junho do mesmo ano, para Lisboa.1923 – Publica Tipografia A Americana de Lisboa o Livro de Sóror Saudade.Em novembro, a poetisa se encontra novamente adoentada e segue para Gonça (Guimarães) a fim de tratar-se.1924 – A 4 de abril, em Lisboa, Antônio Guimarães entra com o pedido de divórcio contra Florbela Espanca, que será deferido em 23 de junho de 1925.1925 – Casa-se em 15 de outubro, com Mário Pereira Lage, médico que contava então trinta e dois anos, passando o casal a residir em Esmoriz.1926 – Florbela e o marido mudam-se para Matosinhos. Apeles gradua-se primeiro-tenente da Marinha.1927 – Florbela inicia o seu trabalho de tradutora de romances franceses para a Civilização do Porto, função que desempenhará até a morte.Em vôo de treino, em 06 de junho, Apeles mergulha no Tejo, diante de Porto Brandão, morrendo tragicamente. Florbela reage pondo-se a produzir com afinco um livro de contos, à memória dele dedicado, o As Máscaras do Destino. Desde então, embora permaneça com a tarefa das traduções - ela se declara quase permanentemente deprimida.1930 – Inicia a colaboração no recém-fundado Portugal Feminino com poemas e contos, na revista Civilização e no Primeiro de Janeiro, ambos de Porto.Inicia um diário a 11 de janeiro, que se encerra em 2 de dezembro com uma única frase “e não haver gestos novos nem palavras novas”.Na passagem de 7 para 8 de dezembro, data do seu aniversário, Florbela d’Alma da Conceição Espanca suicida-se em Matosinhos. É e é enterrada no Cemitério de Sedin. Em 17 de maiode 1964 tem os restos mortais transportados para o Cemitério de Vila Viçosa.

AS TENTAÇÕES DE SANTO ANTÃO - O APOCALIPSE DE BOSCH




AS TENTAÇÕES DE SANTO ANTÃO - O APOCALIPSE DE BOSCH

Cronologicamente a Idade Média teve seu fim com a tomada de Constantinopla pelo Império Otomano, em 1453. O que viria depois ainda seria chamado pelos historiadores do crepúsculo da Baixa Idade Média. A partir da última década da centúria quatrocentista dar-se-ia no sul da Europa um rompimento com as crendices medievais e um renascimento nas artes e na ciência, inspiradas nos clássicos gregos. Esta tendência é vista principalmente nas obras de Leonardo da Vinci e do então incipiente Michelangelo e nos estudos de Copérnico.Mas a aproximação de 1500 trouxe a idéia de que o fim dos tempos estava próximo. E o homem europeu passou a conviver com a idéia de que o Apocalipse dar-se-ia muito em breve. Cristóvão Colombo previa a data do Juízo Final para o ano de 1650. Na contramão do jubileu de Roma de 1500 e das grandes descobertas marítimas, os velhos mitos medievais atormentavam a população do continente. É neste contexto místico que surge a mais apocalíptica de todas as obras de arte : o famoso tríptico do pintor Hieronymus Bosch, As Tentações de Santo Antão.Bosch e Santo AntãoJeroen van Aeken, que se tornou um pintor famoso com o pseudônimo de Hieronymus Bosch, nasceu na Holanda, em 1450, e faleceu em 1516. O pseudônimo de Bosch veio das últimas letras do nome da sua cidade natal: Hertogenbosch. Contemporâneo de Jan van Eyck, Bosch traz um estilo totalmente diferente dos artistas da sua época. A sua obra é marcada pelo fantástico , com figuras simbólicas, complexas, caricaturais, algumas figuras desconhecidas para a sua época. Traz para o século XVI características do que seria o surrealismo do século XX , inspirando gênios como Salvador Dali.As obras de Bosch foram muito apreciadas por Filipe II, da Espanha, daí ter um grande acervo delas em terras ibéricas, principalmente no Museu do Prado, em Madri. Da sua vida há poucos registros. Alguns rumores tornam-se lendários dentro da sua biografia, como o suposto envolvimento com a alquimia e o ocultismo, que teria gerado uma perseguição da inquisição. Não há documentos que comprovem tais fatos, o que fazem deles lendas.As Tentações de Santo Antão, descreve as tentações vividas por Santo Antão, que nasceu no Egito em 251, vivendo grande parte da sua vida no deserto, aonde sofreu terríveis tentações como sofrera Cristo no período de jejum, nos seus quarenta dias no deserto. Conta-se que Santo Antão morreu com 105 anos, em 356. Tem o nome confundido com Santo Antônio de Lisboa (ou de Pádua, na tradição italiana). Para evitar tal confusão, em língua portuguesa é usado o seu nome arcaico: Antão. É conhecido como o Padre do Deserto, e um dos padres mais conhecido e venerado da igreja. Em 1095 foi fundada uma ordem com o seu nome, a ordem dos Antonianos (Canonici Regulares Sancti Antonii).A Obra do ApocalipseAs Tentações de Santo Antão (1500), é uma obra que se encontra atualmente no Museu Nacional de Arte Antiga de Lisboa. Na obra apocalíptica de Bosch as visões do fim do mundo são materializadas em desenhos e pinturas que nos faz ter a idéia do que nos aguarda as profecias, a fustigação do homem por demônios irados e vingativos. Traz um clima sombrio de um homem que traduz em sua obra todos os tormentos da sua época, todas as crenças de uma formação religiosa rígida, nos moldes da igreja medieval vigente em seu país, a Holanda, que brevemente seria abalada pelo surgimento da Reforma. São painéis que pintam em efeitos desconcertantes o definhar dos homens diante da maldição das profecias. Aqui o mundo é grotesco e sente-se ao seu redor o ar putrefato e corrupto.A inspiração com certeza veio com a grande crença que assolou a Europa e o mundo cristão naqueles últimos anos que precederam 1500, a certeza da vinda do anticristo e do Juízo Final.No centro do quadro a figura de Santo Antão, ajoelhado, tranqüilo e impassível diante da fealdade ao redor, olhar confiante nas promessas que irão vencer o mundo satânico que o ladeia, dominado pela essência destrutiva das tentações e das figuras demoníacas e entregues ao pecado e à culpa.O cenário é do fantástico, do mágico, vislumbra o macabro, traz incêndios e monstros imaginários. Há um demônio com crânio de cavalo a tocar alaúde; um peixe metade gôndola, a engolir um homem; uma mulher com calda de lagarto a cavalgar uma ratazana.Numa época em que o Renascimento traduzia corpos perfeitos e nos contemplava com imagens do belo, as imagens das pinceladas de Bosch causam asco e o fascínio do homem diante das profecias, da expiação e da culpa. O belo dá passagem para o bizarro. O homem espera o Juízo Final. Não veio em 1500, será aguardado para 2000. Nas imagens de As Tentações de Santo Antão o presságio daquela que seria a obra do Apocalipse.ALGUMAS OBRAS “FANTÁSTICAS” O Carro de Feno (Museu do Prado, Madri)O Jardim das Delícias (Museu do Prado, Madri)O Juízo Final (Akademie de Bildenden Künste, Viena)As Tentações de Santo Antão – primeira versão (Museu de Arte de São Paulo, São Paulo)As Tentações de Santo Antão – versão definitiva (Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa)Os Sete Pecados Mortais (Museu do Prado, Madri)Navio dos Loucos ou A Nau dos Insensatos (Museu do Louvre, Paris - foto ao lado)Morte e o Avarento (Galeria Nacional de Washington, Washington D.C.)

O ESTRANHO MUNDO DE TAMIRES

O ESTRANHO MUNDO DE TAMIRES
Nelson Silva

Tamires cultivava uma relação maternal com o pequeno frasco transparente que repousava, inanimado, no fundo da gaveta de sua escrivaninha. Ali, em meio à quinquilharias de toda ordem, o amado objeto representava segurança e ternura quando ela sentia-se ameaçada pelos rugidos e movimentos do mundo.
O recipiente cilíndrico tornara-se sua única e afável companhia, com o qual compartilhava o roteiro de seu excêntrico universo juvenil. Podia mesmo sentir a emanação de uma admirável energia quando acolhia-o carinhosamente por entre os delicados e trêmulos dedos de menina, em um ritual de adoração nunca antes relatado.
Na verdade, o frasco, em sua mera condição de simples objeto não valia nada em si. A poção mágica que ele encerrava, essa sim, significava para ela a crucial diferença entre a antítese vida e morte.
Sob os efeitos da felicidade artificial dos amarelecidos e poderosos comprimidos, seus dias em tons de cinema noir transformaram-se repentinamente em alegres festivais matutinos, profusamente coloridos, como aqueles celebrados por alunos - que todos fomos - do primário escolar na saída da sala de aula, logo após o badalo triunfante da sineta, em um radiante carnaval.
No interior do inocente receptáculo portátil, a extensão voluptuosa de um súbito prazer, fulgurante, como o ectoplasma de um gênio das mil e uma noites, alforriado enfim de sua lâmpada, após eternidades de terror e solidão.
Tamires maravilhava-se com a experiência: um preparado químico intervindo magnificamente no cenário estabelecido da existência, dando-lhe acesso à força do universo através do imaginário e saboroso atalho do instinto.
Adouls Huxley a compreenderia?
As propriedades da substância modificavam quase fisicamente o soturno planeta à sua volta. Em sua concepção psicodélica beatnik, ela detinha o controle do sistema de coisas em sua mente e de lá, como de um centro de operações ou de uma torre de comando, tal qual uma divindade maia revestida de poderes supremos, adequava a seu bel-prazer o absurdo de estar viva.
Tamires acabara de sair do jardim da melancolia. Desde o fim da infância estivera ela navegando em longos episódios de depressão, sem causa específica.
O diagnóstico sombrio da patologia, proferido pelos analistas em discordância com a angelical pureza de uma garotinha, soou como um impropério pelos cantos dos gélidos consultórios, em diálogos antissépticos sussurrados com sua mãe: uma boa senhora que, como todas as outras boas senhoras, não merecia passar por aquilo.
Durante o transcorrer de sua suposta enfermidade, Tamires não arriscara pôr o pé na rua, pois havia um monstro lá fora desencaminhando toda a Terra habitada. As notícias dos jornais e o tagarelar zombeteiro da televisão sob hipótese nenhuma poderiam ingressar em seu convívio, visto que um alucinante crime bárbaro repercutiria intensamente em seu comportamento sensível, agravando o já hitchcockeano estado em que ela se encontrava. Uma pesada farmacologia teve que ser prescrita e ela tornara-se reclusa, quase alheia ao que se passava ao seu redor.
As receitas trouxeram para o dia-a-dia de Tamires remédios, receptores de serotonina e um sem-número de outras denominações, bulas e prospectos. Seu verdadeiro arsenal de venenos para exterminar a vetusta dama Tristeza por vezes remontava à incoerência de alguns cientistas do século XIX, que recomendavam arsênico para matar ratos e cianureto para debelar infecções como sífilis.
Então deu-se que, ao fim de uma sexta-feira roxa, à boca da noite, com o barulho dos pratos ricocheteando na cozinha, ela surgiu na escada, rosto levemente maquiado, exalando um discreto perfume, lindamente vestida de negro no esplendor de seus dezesseis anos. Deslizava lenta e suavemente pelos degraus, avançando em direção à sala, após séculos de clausura trancafiada em seu quarto de princesa, atormentada por um dragão que relutava em deixa-la sair das doentias profundezas.
A envelhecida senhora já não lembrava de ter visto sua filha envolvida em tão intenso frescor de liberdade e aparentemente curada de todos os males que a assolavam.
Tamires, com um brilho vulcânico no olhar, lacônica e irresistível, como se fora uma sacerdotisa egípcia levantada das tumbas imemoriais, apenas disse:
- Mãe, comecei a ser feliz hoje, pois amanhã não poderei ser.
Tal revelação bastou para que família e amigos fossem colocados a par da grande notícia. Sua ressurreição mostrou o quanto ela era querida: organizaram até mesmo uma estrondosa festa em sua homenagem nos jardins da casa: um mar de gente veio dar as boas-vindas à Tamires.
Ela, indiferente a tudo, parecia estar se divertindo com toda aquela bajulação, um copo de vinho numa mão, o cigarro escondido na outra.
Entre todas as drogas que passaram por seu crivo, ela havia descoberto o poder miraculoso da idolatrada substância contida em seu amado frasco, a única que julgou realmente capaz de devolver-lhe a vida. Para alívio do médico que, informado da eficiência do fármaco pela própria paciente, não titubeou em receitá-lo, dada à ventura de suas propriedades divinas e também porque estava um tanto quanto desmoralizado pela família em virtude dos sucessivos fracassos naquele tratamento.
O fato é que logo Tamires estava de volta à escola e em pleno convívio social com o mundo que antes a aterrorizava.
Todavia, estava claro: ela não podia mais viver sem aquele rio de toxinas a encher-lhe as veias. Sabia bem disso porque, certa vez, atravessara horríveis horas no meio de uma madrugada, quando o efeito do psicotrópico cessou abruptamente e os espectros que a assombravam começaram a andar perigosamente em derredor.
Ao buscar suprimento para de novo ter acesso às portas do paraíso, descobriu em desespero a embalagem inteiramente vazia. Sob uma capa de pânico, acordou o psiquiatra, que em instantes surgiu na porta da frente, sonâmbulo e insone, com um frasco novinho em folha, cheinho de vida. Vida sintética, a estimular circuitos elétricos e a detonar neuro-explosões em seu cérebro, como se fora o inconcebível personagem de Mary Shelley.
Tamires aprendera a lição e desde então levava consigo aonde quer que fosse o sentido da sua existência no invólucro compacto, assegurando-se de que jamais aconteceria algo semelhante novamente.
Onde já se vira aquilo? Não seria surpreendida pois, prometera a si mesma.
O problema é que ela tinha perdido a noção da realidade, transgredido a fronteira entre sanidade e loucura, embora estes fossem pólos nem tão diametricalmente opostos assim. Para ser sincero, acontecia ali um episódio de abuso de drogas, totalmente avesso à posologia recomendada ao tratamento.
Até mesmo ao mercado negro Tamires já havia recorrido, impelida que fora pela negativa do médico em suprir-lhe o estoque. Este tomou tal decisão pelo fato de já estar bastante desconfiado dos desdobramentos bizarros que ali se descortinavam.
O que se poderia esperar senão um desfecho digno das historietas do Anjo Pornográfico?
Foi assim que sua mãe a encontrou, debruçada sobre a escrivaninha, um mar de sangue tingindo os papéis, pálida e graciosa em seu vestido de donzela, como a bela adormecida do conto de fadas de Charles Perrault.
Por algum motivo, ela, tendo ingerido o último comprimido, usara o recipiente vazio para guardar uma meia dúzia de percevejos, esses pequenos cravos usados para fixar avisos em flanelógrafos, integrantes que eram de um trabalho escolar a respeito de Tristan Tzara, apresentado há poucas horas na Semana de Literatura para uma turma encantada pela eloqüência da gótica menina.
Suspeita-se que, em um tresloucado ato, atacada pela violência da ansiedade, tomada de aflição e com o terrível episódio daquela madrugada ainda fresco na memória, levara o frasco à boca, esquecendo-se completamente do conteúdo.
Um dos cravinhos, ou vários deles, não se sabe precisar ao certo, rasgara sua carótida, provocando a fatal hemorragia, em uma única e derradeira dose letal.
Daquela vez, o frasco continha a morte e não a vida, que vinha sendo tão apaixonadamente administrada e em porções cada vez mais revigorantes.
Decretou-se então o fim do estranho mundo de Tamires.

PHAROS

PHAROS
Nelson Silva

Toda aquela gente já havia, de algum modo, se habituado ao incessante ruído de um frenético martelar que de uns dias para cá estava inquietando sobremaneira o aparente sossego de Vila do Ouro: um obstinado forasteiro desembarcara ali - ao que parece com o intuito de fixar-se definitivamente na região - imbuído da titânica tarefa de construir, sob o sol inclemente, sua habitação. A arquitetura chamava a atenção por destoar em absurdo contraste com os esquálidos casebres que dominavam a rústica paisagem.
O intruso, que parecia ter sido extraído de uma novela de Jack London, demonstrava uma força descomunal no soerguimento dos pesados materiais utilizados em sua prodigiosa obra.
Embora recusasse categoricamente o auxílio dos habitantes locais em sua lida, agradecia a solidariedade exibindo um sorriso laranja, fruto talvez do eterno uso de um proeminente cachimbo ocre, teimosamente dependurado nos grossos lábios.
Inexplicavelmente, atraíra o amor interesseiro de um pequeno ajuntamento de gatos. Presumia-se ser em virtude do odor de peixe ( sabe-se lá de onde trouxera o petisco! ) que exalava da propriedade, sobretudo ao cair da tarde, elegendo-os – e os bichanos a ele - como únicos e devotados companheiros.
De onde quer que houvesse saído o inusitado ser, não fazia sentido algum a sua presença e o seu curioso edifício em Vila do Ouro, um ponto perdido nos confins de uma árida planície, onde lagartos e homens sobreviviam penosamente ao lado de escorpiões e cactos.
Os subterrâneos outrora abundantes em ouro e que fascinaram levas e levas de exploradores atualmente não passavam de catacumbas que encerravam em suas entranhas apenas sonhos soterrados. Após o veio metálico definhar completamente, aqueles que não puderam bater em retirada nas caravanas esfarrapadas que desapareciam no horizonte fundaram ali o remoto povoado.
Já que o ouro lhes levara a alma, então que ao menos suas picaretas continuassem escavando a terra seca em busca de água para lavar-lhes o sangue.
De qualquer forma, como não reuniram coragem suficiente para interpelar a exótica criatura, assimilaram-na ao cenário íngreme, embora sua fantástica construção causasse contínua surpresa entre aqueles homens rudes.
Ainda estavam para ver, contudo, algo muito mais impressionante.
Poderia o feérico personagem ter erigido seu solar no litoral, onde decerto contemplaria as velas esvoaçantes das embarcações no oceano, mas encontrava-se tão distante da orla marítima quanto os esquimós estão para as tribos nômades do Saara.
Dir-se-ia mesmo que sua indumentária soava inadequada ao estereótipo daquele século moderno e, para dizer a verdade, não se ouvira dele uma palavra inteligível sequer que fosse compatível com o vocabulário usual da população.
A estranha figura era como uma miragem no deserto escaldante.
À medida que os dias se sobrepujavam uns aos outros, o ruído dos afazeres do estranho fizera-se mais intenso, dando a entender que ele estivesse a correr contra o tempo.
Ao cabo de algumas semanas, poderia se distinguir algo como uma torre de gávea, mas não se chegou a nenhuma conclusão a respeito.
A urgência nervosa da atividade infernal percorria os ouvidos e singrava os espíritos atormentados da vizinhança, a essa altura bastante familiarizada com a labuta insólita de seu Hércules provinciano.
No meio de uma determinada noite, porém, o inquietante barulho cessou abruptamente.
Ao romper de uma aurora incerta, os primeiros raios de sol violeta finalmente revelaram a estupenda criação.
O herói, ao que parece, despencara do alto da desmedida estrutura que vinha há tempos edificando: jazia estatelado ao solo, junto às pedras de granito, mármore, resina e calcário remanescentes de sua elaborada edificação.
Soube-se logo que fora sumariamente executado por aqueles pobres diabos. Um pequeno grupo de bandoleiros cumpriu com enorme competência a promessa de dar cabo de sua existência naquela madrugada com o sórdido objetivo de assenhorear-se do ouro que julgavam ter ele encontrado.
Acima dos conspiradores, o portentoso farol erigido aos ares pelo ádvena os contemplava imponentemente, lançando incandescentes luzes de fornalha, de um nítido branco, aos recônditos mais inacessíveis do lugarejo, e aterrorizando os mochos, que já não mais distinguiam o dia da noite nem a morte da solidão.
Era como se estivessem na ilha de Pharos, em 280 a.C., aos pés da admirável invenção do rei Ptolomeu II, projetada pelo arquiteto grego Sostratus de Cnidos, a saber, o Farol de Alexandria, uma das maravilhas do mundo antigo.
Teria o enigmático construtor soerguido aquela inusitada obra de engenharia, em Vila do Ouro, para defender aqueles miseráveis de alguma iminente catástrofe de que somente ele, em sua aparente loucura, tivesse conhecimento?
Antes que se refizessem da assombrosa visão e sem tempo de concluir suas elucubrações, foram surpreendidos de forma trágica por uma gigantesca embarcação talvez fenícia, quem sabe comandada pelos marinheiros perdidos de Necho, que irrompeu violentamente do nada, como se mar e praia ali houvesse, espatifando-se sobre o povoado e matando todos que ali no momento se encontravam.
Os poucos sobreviventes da tragédia enlouqueceram de forma progressiva e pereceram logo em seguida, já que era absolutamente impossível compreender e conviver ao mesmo tempo com a assustadora cena de um farol que não dava para mar algum.
Dizem que atualmente apenas mochos habitam a região, compartilhando-a com lagartos, escorpiões e cactos.
Ah, e gatos, é claro.

DR. TELLER

DR. TELLER
Nelson Silva

O respeitado Dr. Teller não parecia excêntrico nem senil. Aos 86 anos, o brilhante cientista ainda era muito requisitado entre estudantes, repórteres, admiradores e pela fina flor da comunidade acadêmica em sua belíssima propriedade, na área residencial de sua estimada universidade. A sumidade recebia a todos com muita elegância e cortesia, afundado em sua poltrona de uma cor opaca, numa voz poderosa, levando os aprendizes aos áureos tempos em que discorrera sobre sua polêmica pesquisa biológica, onde tentara demonstrar, sem êxito, que a salvação ética da humanidade residia no estudo da evolução dos microorganismos causadores de patologias e em sua intrínseca relação com a espécie humana.
- Um vírus em sua gênese é mortal, – dizia – mas ao longo do tempo em que estivesse co-existindo com o homem, aperfeiçoar-se-ia mutuamente, junto com o homem, condicionando as duas espécies a um estágio padrão de desenvolvimento moral que, por sua vez, aniquilaria qualquer instinto predatório e parasitário, embora as primeiras gerações tendessem a desaparecer precocemente em detrimento das próximas.
- Tal processo – rosnava ele – repercutiria na estruturas dos genes vitais a ponto de mudar a ótica da lei da sobrevivência das espécies.
Escusado dizer que o Dr. Teller fora muito combatido pela comunidade científica de seu tempo e tão duro discurso apresentara-se difícil de assimilar, já que sugeria a suspensão de todo e qualquer remédio ou tratamento médico para vítimas de enfermidades provocadas por microorganismos.
- Morrerão milhões, mas os descendentes inaugurarão uma nova era na história da humanidade: a era da perfeição moral e física do homo sapiens. Como vêem, está na hora do sacrifício. – propagava ele a inúmeras platéias estarrecidas ao redor do globo.
Na verdade o Dr. Teller era um apaixonado pela raça humana e não aceitava o fato de como uma fantástica criatura dotada de tanta complexidade fosse obcecada em derramar o próprio sangue. O renomado homem de ciências saíra perplexo da I Guerra mundial, entrara em colapso após o II grande cataclisma e, ao presenciar inocentes despencando do alto do World Trade Center em chamas, desiludiu-se para .
- A humanidade não quer se salvar. – concluiu, impotente e ferido por dentro.
Convidado a retirar-se ao ocaso e sobretudo depois de sofrer um atentado no qual morrera-lhe a mulher, fora habitar no campus, no meio de seu adorado ambiente acadêmico, onde transmitia seu amplo conhecimento às debutantes gerações. Jamais aposentara-se e era visto constantemente a fitar as estruturas cósmicas que resplandeciam no céu noturno, como se estivesse a confabular com civilizações em adiantado estágio de evolução, a duzentos anos-luz dali.
Estava absolutamente convicto de que o drama da morte e da violência no inconsciente coletivo humano estimulava o fenômeno do registro automático da memória, privilegiando a por ele denominada “possibilidade do fim” nos arquivos intangíveis da personalidade, que por sua vez desencadeava súbitas cadeias de pensamentos negativos e auto-destruidores. Estes, por sua vez, disparariam um gatilho emocional instantâneo, que seria responsável pelas várias modalidades de mortandade e carnificina em série verificadas em todas as camadas da sociedade humana ao longo dos tempos.
Mas ultimamente o eminente professor estava comprometido com um projeto mais arrojado. Julgava-se capaz de empreender sua última missão científica, a despeito de uma depressão que o estava acometendo. Tencionava organizar uma expedição com o objetivo de encontrar os últimos exemplares ativos preservados do vírus da gripe espanhola, a mais terrível pandemia da História, que em apenas dois meses do longícuo 1918 dizimou nada mais nada menos do que 20 milhões de pessoas.
Quando ficou a par dos intentos do mestre, o reitor farejou aí boa publicidade para sua combalida universidade e transformou a aventura do Dr. Teller em um grandioso evento acadêmico, onde até mesmo o governador compareceu, trazendo consigo um sem-número de ex-detratores do abnegado cientista.
O Dr. Teller sabia que a única chance de encontrar o vírus seria localizar corpos que, uma vez enterrados estivessem completamente congelados. E assim, os “Sentinelas da Humanidade” - que era como a imprensa havia batizado sua equipe - partiram para as regiões mais remotas do planeta, em busca do terrível inimigo adormecido.
Tentaram cemitérios no Alasca, Sibéria e Islândia, sem obter sucesso. Sua extraordinária força de vontade, porém, contagiou a todos e parecia que o professor – obstinado – estava na flor da idade, como na época em que defendia sua teoria tenazmente.
Ao cabo de quatro anos seu esforço foi recompensado: descobriu uma pequena ilha congelada nos confins do Ártico, onde o gelo jamais derretia. Desbravando a tundra, trouxe à tona sete múmias de gelo preservadas há décadas. Tratavam-se de alpinistas que contraíram o vírus na Europa ao fim da I Guerra. Com dois enormes tubos de biópsia, extraiu fragmentos de pulmões, garganta e cérebro dos corpos e, num improvisado laboratório de segurança máxima, conseguiu isolar o micróbio letal.
O Dr. Teller tinha em mente divulgar sua singular e festejada descoberta em uma excursão ao redor do mundo. Afinal de contas, estava no ápice de sua carreira. E, pela primeira vez, com um incomensurável poder de destruição nas mãos.
Jul/06

O COMEÇO DO FIM DO MUNDO



23 de Dezembro de 2005 a 10 de janeiro de 2006


O COMEÇO DO FIM DO MUNDO Trinta anos depois do desencadeamento do punk, o ideal anárquico do movimento ainda pode ser percebido em diversas frentes da cultura por Luiz Rebinski Junior ( mailto:jrrebinski@yahoo.com.br)
punk, aclamado como o último grande movimento jovem de contracultura, virou trintão. Novembro de 1975 é considerado o marco zero do irmão rebelde do rock. A data remete ao primeiro show dos Sex Pistols, realizado na St. Martins Art School, em Londres.
Ainda que bandas norte-americanas como Television, Stooges e Ramones já estivessem fazendo o punk rock – como gênero musical – acontecer antes do movimento tomar de assalto a Grã-Bretanha, foi com os Pistols e o The Clash que o “ do it yourself ”, lema máximo do punk, ganhou corpo e se alastrou pelo mundo, angariando adeptos em diversas expressões da arte, como literatura, cinema e moda.
Considerado a maior farsa do rock' n' roll, o Sex Pistols foi idealizado pela dupla Vivienne Westwood, uma estilista maluquete dona de uma loja de roupas com tendências fetichistas no centro de Londres, e Malcolm McLaren, um empresário canastrão cheio de “boas intenções”. Para divulgar a loja da esposa, McLaren, que tinha tido uma experiência como agenciador da banda New York Dolls, resolveu cooptar alguns jovens desocupados que viviam perambulando próximo ao estabelecimento de Westwood para a sua mais engenhosa criação: uma banda de rock. Assim nascia o Sex Pistols, um grupo de músicos que não eram músicos, apenas vagabundos que queriam subverter a ordem dominante da Inglaterra de Thatcher. Com tal espírito e totalmente desprovidos de habilidades musicais, o grupo criou um tipo de som rudimentar e cru que remetia, de imediato, às bandas garageiras dos anos 60.
Opondo-se totalmente ao virtuosismo que dominava o rock na década de 70 – o vocalista dos Pistols andava com uma camiseta onde se lia “eu odeio o Pink Floyd” –, os pupilos de McLaren – Johnny “Rotten” Lydon (vocalista), Steve Jones (Guitarrista), Paul Cook (Baterista) e Glen Matlock (baixista), mais tarde Sid Vicious – formavam a verdadeira legião da má vontade. Esqueça o make love not war e o flower power . Os punks, em geral filhos de operários vindos dos subúrbios ingleses e sem voz ativa na sociedade, queriam mesmo é bagunçar o coreto, fazer sua própria arte e não mais esperar pelos benefícios que o capitalismo nunca lhes trouxe. Desencantados com o mundo, os Pistols e seu público surgiam como contraponto ao bom-mocismo dos hippies.
O som era mais do que básico. Três acordes, tocados em velocidade máxima acompanhando letras que falavam em no future e anticristo. Tudo isso adornado por um visual radical, que incluía alfinetes, calças jeans apertadas, camisetas surradas, tênis rasgados, jaquetas de couro e cabelos coloridos. Um verdadeiro escândalo para a sociedade de então. O choque dos conservadores ante o aspecto bizarro daqueles jovens garantiu a visibilidade do movimento nascente. Portanto a moda punk, creditada em muito a Vivienne Westwood, foi um importante instrumento para a divulgação da niilista e anárquica ideologia que surgia – ainda que tal ideologia não fosse tão clara e consistente em seus argumentos e reivindicações.
O visual agressivo era o diferencial entre os conformados e os rebeldes, àqueles que não se dobravam e ao mesmo tempo desdenhavam a industria da moda e do consumo fácil. Dessa maneira, o binômio música tosca e indumentária rebelde deu o tom do punk; e os dois nunca mais se separaram.
O fato do primeiro disco dos Sex Pistols, Never mind the bollocks – Here's the Sex Pistols , ter sido lançado quando a banda já estava praticamente desfeita, reforça a idéia de que o punk, como fenômeno sociocultural de resistência, sempre teve mais relevância do que a cena musical que se formou em sua volta. Ou seja, é bem provável que mesmo sem os Pistols e o Clash, o punk nasceria e se espalharia pelo mundo. Isso não quer dizer que a música não foi importante. A principio é impossível dissociar o gênero musical do movimento social. Prova disso são os petardos “God save the queen”, “Anarchy in the U.K.”, “Problems” e “EMI”, faixas do clássico disco de estréia da banda que ainda ecoam nos aparelhos de som do mundo inteiro.
Porém o que prevalece é a aura e o espírito contestador dos primeiros anos do punk. Em uma análise sociológica do que representou a mobilização dos jovens ingleses, pode-se dizer que a atitude defendida pelo “faça você mesmo” foi mais importante do que os fabulosos acordes mal tocados dos Pistols. O engajamento político de tendências socialistas, mais tarde intensificado com a militância do The Clash, também ajudou a moldar o punk. Conforme o chavão mais repetido entre seus adeptos, o “punk é um estilo de vida” e não apenas um tipo de música rebelde e intransigente.
Punk de Butique
Mas hoje, três décadas após o início da baderna desencadeada pelos garotos de Londres, à luz dos fatos e da história, é inevitável a discussão a respeito de como os preceitos do punk vêm sendo encarados na sociedade contemporânea – tanto por aqueles que têm a missão de levar à frente os seus conceitos, como pelo establishment de um modo geral.
Uma das críticas recorrentes ao movimento – mas não só a ele – é que suas bravatas já foram completamente assimiladas pela onipresente industria cultural, transformando o punk em mais um dos subprodutos do capitalismo. Em outras palavras, a anarquia virou mercadoria.
Um livro lançado recentemente, cujo título é bastante sugestivo e irônico – The Rebel Sell [algo como A Rebeldia Fajuta ] –, defende que em vez de funcionar como força de oposição à economia de mercado, a contracultura é, nada mais nada menos, seu combustível.
Segundo os filósofos canadenses Andrews Potter e Joseph Heath, autores do livro, os símbolos da rebeldia não são apenas cooptados pelo mainstream , mas é a própria contracultura que impulsiona o crescimento do capitalismo, gerando competição entre os consumidores das novas bricolagens e adereços.
Daí surgem os conceitos de “hippie chique” e “punk de butique”. Nesse sentido, a imagem de Ernesto “Che” Guevara estampada em camisetas, broches e jaquetas, é um dos exemplos mais fáceis. A moda do piercing , antecipada pelos grossos alfinetes que os garotos ingleses enfiavam em seus narizes é outro caso exemplar.
A estética punk, vislumbrada por Vivienne Westwood, foi tão bem sucedida que lhe rendeu a alcunha de Rainha Punk. A linguagem de suas roupas, escandalosa para as pessoas que viviam nos anos 70, é totalmente aceita na sociedade de hoje, permanecendo viva na moda de estilistas famosos como Jean-Paul Gaultier. As calças baixas e rasgadas, os adereços de metal e os tênis All Star – imortalizados por figuras como Joey Ramone – estão em todas as partes, vendidos inclusive em butiques famosas e em shoppings.
Daí pode-se concluir que a linha divisória entre a contracultura e a cultura de massa é bastante tênue. Em geral, o que está na moda hoje é o que foi alternativo ontem. Tal processo de transformação, do cult para o mainstream , segundo os filósofos canadenses autores de The Rebel Sell , é impulsionado pelos próprios atores que constituem o “sistema”. Funciona mais ou menos assim: quando as pessoas começam a imitar o estilo de um ícone rebelde, o rebelado precisa encontrar outra forma de se rebelar, já que o seu antigo costume não é mais singular. Portanto, sempre que um comportamento rebelde é popularizado, ele se torna inútil como forma de expressão, pois virou mainstream . Então é necessário criar outro meio de diferenciação, de ser diferente e cool .
A idéia parece radical, mas faz bastante sentido quando a análise é direcionada à cena musical independente de rock. É bastante comum se ouvir que dado grupo “se vendeu” para o sistema porque assinou contrato com uma grande gravadora – uma major na linguagem da indústria fonográfica. A partir do momento que uma banda do underground passa a fazer sucesso fora dos domínios do meio independente – clubes e lojas de discos –, ela já não é mais “pura”, autêntica e, principalmente, rebelde.
O próprio Sex Pistols provou do veneno maniqueísta do underground ao ser repudiado pelos fãs quando se reuniu para fazer uma turnê assumidamente caça-níquel chamada “A excursão do lucro imundo”. Caso parecido ocorreu com o The Clash, quando teve um de seus hits usados como fundo musical para um comercial da marca Levi's.
Mas ainda que o punk tenha sucumbido em seus próprios desígnios e conceitos, é fato que sua influência ainda é bastante presente. Na música, após o final dos anos 70, uma leva de boas bandas surgiu aproveitando o que de melhor os rapazes de cabelos espetados tinham feito. The Cure, Echo and the Bunnymem e Joy Division adicionaram uma dose de desesperança e alguns acordes ao som básico de seus predecessores, inaugurando a Era Pós-punk, que se caracterizou como uma tentativa de organizar margens alternativas de produção e divulgação da musica pop. É fato que depois disto o gênero se desdobrou em mil segmentos e perdeu a veia pulsante dos primeiros anos.
Já em outras esferas da cultura, ainda que velado, “o faça você mesmo” está bastante presente hoje. Pode ser percebido, por exemplo, no modo de confecção de discos desprendido por músicos independentes. Aliados à tecnologia, grupos desconhecidos não precisam mais esperar por um contrato com uma gravadora para terem suas criações registradas. A popularização dos meios de produção fonográfica endossou e tornou novamente em voga o preceito mais conhecido do movimento punk – não espere pelos outros, grave você mesmo seu som. Artistas assumindo o controle de sua própria arte – desde a escolha do repertório e tipo de som até o modo de divulgação – não é mais um sonho utópico e distante. Há ainda a cibercultura punk, espécie de cruzada contra o monopólio das grandes redes de informática. Neste ramo, a troca de músicas pela Internet talvez seja um dos exemplos mais emblemáticos.
Porém, é preciso admitir que o punk, desde seu nascedouro, sempre foi um movimento despretensioso. Foi meio sem querer que um maluco chamado Malcolm McLaren achou um grupo de rapazes mais maluco ainda e formou uma banda que tinha tudo para dar errado – e não deu. Seu alastramento mundo afora foi um processo natural que, pouco a pouco, tomou corpo. E foi exatamente a falta de “objetivos claros” que fez o punk chegar aos mais remotos lugares do planeta. Foi justamente através da forma anárquica de organização que o movimento se organizou e deixou rastros em áreas que vão da previsível moda à era digital.

Ultraje

Diferentemente do início dos anos 80, atualmente, o Ultraje a Rigor não é um banda brasileira de rock´n´roll idolatrada no cenário nacional, muito menos é conhecida pela grande maioria da garotada com menos de 25 anos. Perdeu seu lugar para Pitty, CPM 22 e seus acólitos – o que é uma pena – pois com isso, o rock brasileiro perde muito (e sem deixar sucessores), seu caráter irreverente e debochado (características basilares da banda) que é tão fundamental para o rock permanecer, como em seu estado mais puro e arcaico, um ritmo que promove acima de tudo, a diversão e a alegria tanto dos rock stars como do seu público.
A crescente influência do marketing no mercado fonográfico ofusca cada vez mais o prazer e a liberdade da realização artística. Com isso, o que vemos é que a falta de criatividade, a mesmice e a demasiada “pose” imperam entre artistas e produtores, fazendo com que eles fiquem cada vez mais “profissionais” e distantes em sua relação com o público e também com sua auto-sinceridade de realizarem o que realmente gostam. Mas com o Ultraje a Rigor nunca foi assim, graças a Roger Rocha Moreira, ou simplesmente Roger, líder eterno desse memorável grupo que consolidou seu lugar de honra na história da música brasileira.
Quando os Ramones proclamavam: “It´s the end of the seventies”, o Ultraje nascia da parceria entre e Roger e Leôspa, com uma composição “gozando com a cara de um amigo”: Mauro Bundinha. Estava assim instaurado o característico espírito escrachado do “Ultraje a Rigor” – nome que surgiu de uma conversa informal numa festa onde Roger sugeriu à Leôspa o nome de “Ultraje”, foi quando Edgar Scandurra, hoje guitarrista do IRA!, chegou no meio da conversa e perguntou: “Que Ultraje? Ultraje a Rigor?”. Bingo !
O rock nacional tinha seu boom no início dos anos 80 com Blitz, Lulu Santos e CIA. Neste cenário, Roger, Leôspa, Maurício e Edgar foram contratados pela WEA e gravaram o primeiro compacto do Ultraje: “Inútil/Mim quer Tocar”. Depois, Edgard escolheu ficar definitivamente com o IRA!, e para seu lugar foi chamado Carlinhos, quando o grupo gravou, em 1984, seu segundo compacto “Eu me Amo/Rebelde sem Causa” e também um dos mais importantes álbuns da história do rock brasileiro: “Nós vamos invadir sua praia”, o primeiro LP da banda.
Nós vamos invadir sua praia (1984) foi o primeiro disco de rock nacional a conseguir discos de ouro e platina. O disco era composto de grandes hits, das 11 músicas do disco, 9 foram tremendo sucesso, entre elas as clássicas: Inútil, Ciúme, Eu Me Amo, Zoraide e Marylou. Após seu debut fonográfico, a banda era um tremendo sucesso nacional e consolidou ainda mais sua fama com o igualmente bem sucedido segundo LP Sexo!! (1987) – agora com Sergio Serra e sem Carlinhos. O álbum emplacou, entre outros, o hit Pelado!, que foi tema de abertura da novela da Rede Globo: Brega & Chique.
Com a renovação do cenário do rock nacional no início dos anos 90, o Ultraje perdeu um pouco seu espaço, e após 4 anos de sucesso ininterrupto, gravaram seu terceiro LP: “Crescendo”, que não teve o mesmo impacto de seus antecessores. Disco mais experimental e diverso, o álbum provocava polêmica com a canção Filha da Puta e O Chiclete – por conterem palavrões, que eram ainda inadequados para radiodifusão na época, e também com Volta Comigo - que falava de adultério.
Em 1990, no início de um período de ostracismo na mídia, a banda voltou as suas origens com o lançamento de “Por Quê Ultraje a Rigor?”. Disco obscuro, mas um precioso achado para fãs da banda e do rock mais divertido e irreverente. O repertório era composto de um apanhado de covers favoritos que o grupo tocava em seu início, além de diversas gozações musicais, como o tema musical do clássico seriado de TV “Os Monstros” e a “regravação” de sua primeira “gravação”: Mauro Bundinha. Destaque para as versões de clássicos como Barbara Anne, Nobody But Me e Slow Down – em uma versão eletrizante com Sergio Serra caprichando na guitarra, que, acreditem, ficou melhor que a gravação que os Beatles fizeram para esta mesma música.
Após brigas com a gravadora devido à divirgência de interesses e com uma nova formação - saíram da banda Maurício, Sérgio Serra e o velho companheiro Leôspa e entraram Heraldo, Serginho e Flávio - é lançado O Mundo Encantado do Ultraje a Rigor (1992) – disco misto de gravações inéditas e regravações que teve fraco apelo; depois lançaram Ó (1993), sexto LP do grupo, o quarto com músicas inéditas, que foi gravado às pressas por imposição da gravadora e que teve pouca divulgação. Com isso, os anos 90 pareciam mesmo anunciar o fim do Ultraje a Rigor, mas Roger (eterno líder da banda) nunca deixou a peteca cair, mesmo sem a exposição pública de outrora, o Ultraje continuava sempre o Ultraje: tocando para 100 pessoas ou para 100.000.
Quando os anos 70 acabaram surgiu o Ultraje a Rigor, e quando o século XXI despontava, a banda “ressurgia” na mídia com a satírica canção Nada a Declarar – que descia a boca na mesmice que imperava no mundo musical e entre os jovens em geral – e constava no álbum 18 Anos sem Tirar! (1998), que recebeu disco de ouro. Depois, em 2002, e com nova formação: Roger, Mingau (ex-Ratos de Porão, Inocentes e 365), a volta de Sergio Serra e Bacalhau (ex-Rumbora e Little Quail), a banda lança o “surf álbum”: “Os Invisíveis”. Aquém de modismos, o disco ratifica a imortalidade do rock debochado e hilariante característico da banda e a coloca de novo nos anais do mainstreim, o que leva, em 2005, a realização do Acústico MTV, que expôs melhor o grupo para toda uma nova geração de potenciais fãs.
Não conhece o Ultraje? Não viu o acústico? Corra para banca de jornais, compre e veja! Mas, se quer “sentir” o que é o Ultraje a Rigor, vá ver um show da banda: sempre recheados de empolgação e de uma rara sinceridade que envolve seus músicos e seu público. Inesquecível um show em que a banda tocava para poucas pessoas em um pequeno palco de São Paulo e de repente, olho para o lado, e me deparo com Sergio Serra - que escapou do palco para deixar a guitarra para uma participação especial do ex-integrante Carlinhos – soltando um sorriso e se divertindo com a apresentação da banda no palco – isso mesmo: ele saiu do palco e se juntou ao público para contemplar os próprios companheiros !
O Ultraje é como diz o texto da contracapa de estilo “seissentista” de seu disco de 1990: “Ultraje a Rigor é mais do que uma banda de rock, é um jeito de ser que uns entendem e outros não”. Quem “entende” percebe a energia, a vibração e a alegria desse conjunto musical liderado pelo divertido e sempre boníssima praça Roger Rocha Moreira - que como disse Lobão uma vez: é o Adoniran Barbosa do rock nacional ! O Ultraje nunca se moldou ou se distorceu frente a modismo ou tendências para se manter nas paradas de sucesso, sempre foi ele mesmo: alternativo e popular, sarcástico e político, sagaz e debochado, crítico e irreverente… Bom para seu velho público fiel, bom para seus novos fãs de cada dia, enfim, bom para quem “entende”…
por Luiz A. Augusto