Diferentemente do início dos anos 80, atualmente, o Ultraje a Rigor não é um banda brasileira de rock´n´roll idolatrada no cenário nacional, muito menos é conhecida pela grande maioria da garotada com menos de 25 anos. Perdeu seu lugar para Pitty, CPM 22 e seus acólitos – o que é uma pena – pois com isso, o rock brasileiro perde muito (e sem deixar sucessores), seu caráter irreverente e debochado (características basilares da banda) que é tão fundamental para o rock permanecer, como em seu estado mais puro e arcaico, um ritmo que promove acima de tudo, a diversão e a alegria tanto dos rock stars como do seu público.
A crescente influência do marketing no mercado fonográfico ofusca cada vez mais o prazer e a liberdade da realização artística. Com isso, o que vemos é que a falta de criatividade, a mesmice e a demasiada “pose” imperam entre artistas e produtores, fazendo com que eles fiquem cada vez mais “profissionais” e distantes em sua relação com o público e também com sua auto-sinceridade de realizarem o que realmente gostam. Mas com o Ultraje a Rigor nunca foi assim, graças a Roger Rocha Moreira, ou simplesmente Roger, líder eterno desse memorável grupo que consolidou seu lugar de honra na história da música brasileira.
Quando os Ramones proclamavam: “It´s the end of the seventies”, o Ultraje nascia da parceria entre e Roger e Leôspa, com uma composição “gozando com a cara de um amigo”: Mauro Bundinha. Estava assim instaurado o característico espírito escrachado do “Ultraje a Rigor” – nome que surgiu de uma conversa informal numa festa onde Roger sugeriu à Leôspa o nome de “Ultraje”, foi quando Edgar Scandurra, hoje guitarrista do IRA!, chegou no meio da conversa e perguntou: “Que Ultraje? Ultraje a Rigor?”. Bingo !
O rock nacional tinha seu boom no início dos anos 80 com Blitz, Lulu Santos e CIA. Neste cenário, Roger, Leôspa, Maurício e Edgar foram contratados pela WEA e gravaram o primeiro compacto do Ultraje: “Inútil/Mim quer Tocar”. Depois, Edgard escolheu ficar definitivamente com o IRA!, e para seu lugar foi chamado Carlinhos, quando o grupo gravou, em 1984, seu segundo compacto “Eu me Amo/Rebelde sem Causa” e também um dos mais importantes álbuns da história do rock brasileiro: “Nós vamos invadir sua praia”, o primeiro LP da banda.
Nós vamos invadir sua praia (1984) foi o primeiro disco de rock nacional a conseguir discos de ouro e platina. O disco era composto de grandes hits, das 11 músicas do disco, 9 foram tremendo sucesso, entre elas as clássicas: Inútil, Ciúme, Eu Me Amo, Zoraide e Marylou. Após seu debut fonográfico, a banda era um tremendo sucesso nacional e consolidou ainda mais sua fama com o igualmente bem sucedido segundo LP Sexo!! (1987) – agora com Sergio Serra e sem Carlinhos. O álbum emplacou, entre outros, o hit Pelado!, que foi tema de abertura da novela da Rede Globo: Brega & Chique.
Com a renovação do cenário do rock nacional no início dos anos 90, o Ultraje perdeu um pouco seu espaço, e após 4 anos de sucesso ininterrupto, gravaram seu terceiro LP: “Crescendo”, que não teve o mesmo impacto de seus antecessores. Disco mais experimental e diverso, o álbum provocava polêmica com a canção Filha da Puta e O Chiclete – por conterem palavrões, que eram ainda inadequados para radiodifusão na época, e também com Volta Comigo - que falava de adultério.
Em 1990, no início de um período de ostracismo na mídia, a banda voltou as suas origens com o lançamento de “Por Quê Ultraje a Rigor?”. Disco obscuro, mas um precioso achado para fãs da banda e do rock mais divertido e irreverente. O repertório era composto de um apanhado de covers favoritos que o grupo tocava em seu início, além de diversas gozações musicais, como o tema musical do clássico seriado de TV “Os Monstros” e a “regravação” de sua primeira “gravação”: Mauro Bundinha. Destaque para as versões de clássicos como Barbara Anne, Nobody But Me e Slow Down – em uma versão eletrizante com Sergio Serra caprichando na guitarra, que, acreditem, ficou melhor que a gravação que os Beatles fizeram para esta mesma música.
Após brigas com a gravadora devido à divirgência de interesses e com uma nova formação - saíram da banda Maurício, Sérgio Serra e o velho companheiro Leôspa e entraram Heraldo, Serginho e Flávio - é lançado O Mundo Encantado do Ultraje a Rigor (1992) – disco misto de gravações inéditas e regravações que teve fraco apelo; depois lançaram Ó (1993), sexto LP do grupo, o quarto com músicas inéditas, que foi gravado às pressas por imposição da gravadora e que teve pouca divulgação. Com isso, os anos 90 pareciam mesmo anunciar o fim do Ultraje a Rigor, mas Roger (eterno líder da banda) nunca deixou a peteca cair, mesmo sem a exposição pública de outrora, o Ultraje continuava sempre o Ultraje: tocando para 100 pessoas ou para 100.000.
Quando os anos 70 acabaram surgiu o Ultraje a Rigor, e quando o século XXI despontava, a banda “ressurgia” na mídia com a satírica canção Nada a Declarar – que descia a boca na mesmice que imperava no mundo musical e entre os jovens em geral – e constava no álbum 18 Anos sem Tirar! (1998), que recebeu disco de ouro. Depois, em 2002, e com nova formação: Roger, Mingau (ex-Ratos de Porão, Inocentes e 365), a volta de Sergio Serra e Bacalhau (ex-Rumbora e Little Quail), a banda lança o “surf álbum”: “Os Invisíveis”. Aquém de modismos, o disco ratifica a imortalidade do rock debochado e hilariante característico da banda e a coloca de novo nos anais do mainstreim, o que leva, em 2005, a realização do Acústico MTV, que expôs melhor o grupo para toda uma nova geração de potenciais fãs.
Não conhece o Ultraje? Não viu o acústico? Corra para banca de jornais, compre e veja! Mas, se quer “sentir” o que é o Ultraje a Rigor, vá ver um show da banda: sempre recheados de empolgação e de uma rara sinceridade que envolve seus músicos e seu público. Inesquecível um show em que a banda tocava para poucas pessoas em um pequeno palco de São Paulo e de repente, olho para o lado, e me deparo com Sergio Serra - que escapou do palco para deixar a guitarra para uma participação especial do ex-integrante Carlinhos – soltando um sorriso e se divertindo com a apresentação da banda no palco – isso mesmo: ele saiu do palco e se juntou ao público para contemplar os próprios companheiros !
O Ultraje é como diz o texto da contracapa de estilo “seissentista” de seu disco de 1990: “Ultraje a Rigor é mais do que uma banda de rock, é um jeito de ser que uns entendem e outros não”. Quem “entende” percebe a energia, a vibração e a alegria desse conjunto musical liderado pelo divertido e sempre boníssima praça Roger Rocha Moreira - que como disse Lobão uma vez: é o Adoniran Barbosa do rock nacional ! O Ultraje nunca se moldou ou se distorceu frente a modismo ou tendências para se manter nas paradas de sucesso, sempre foi ele mesmo: alternativo e popular, sarcástico e político, sagaz e debochado, crítico e irreverente… Bom para seu velho público fiel, bom para seus novos fãs de cada dia, enfim, bom para quem “entende”…
por Luiz A. Augusto
sábado, 16 de agosto de 2008
Ultraje
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Um comentário:
muito bom mesmo!
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