terça-feira, 23 de junho de 2009

Revoluções nas ondas paulistanas

Se existe um disco que causou pânico em São Paulo foi Revoluções por minuto, do RPM, de 1985. Hoje, esse disco é visto por duas óticas antropológicas: trash (no sentido cool da coisa) e lixo (no sentido cu da coisa). Mas por trás desses pré-conceitos, existe um grande disco. Paulo Ricardo, Luiz Schiavon, Paulo Pagni e Fernando Deluqui cometeram um disco sintonizadíssimo com o que de mais moderno estava sendo feito no pop-rock de então. Os toques neo-romantics, o verniz new-wave, o clima pós-punk e as letras bem construídas de Paulo Ricardo - com um toque até adulto, em contraste com a temática adolescente quase dominante.

Eu ganhei o Revoluções por minuto no meu aniversário de 10 anos, de presente do meu pai – que contrabandeava eletro-eletrônicos da Zona Franca de Manaus (“pirataria nas ondas do rádio”) – junto com um gravador portátil com um deck toca-fitas e rádio am/fm. Logo de cara, fui pego com músicas como “Louras geladas” e “Revoluções por minuto”, de um apelo pop muito forte, sem serem totalmente descartáveis e bem produzidas, com um apuro instrumental inédito para o padrão. O clima remetia a um cenário de revoluções, de abertura, de juventude.

Era um disco quase onipresente (Rádio pirata ao vivo era onipresente) e toda hora você ouvia alguma em algum lugar. As garotas alucinavam quando viam Paulo Ricardo. Os homens sentiam inveja e os adolescentes – como eu – queriam ser ele. Não somente por ser um rock star, tendo as suas músicas cantadas por todo mundo, mas também por ser o sortudo que ia para casa com a modelo-ninfeta Luciana Vendramini, uma das maiores musas dos pubescentes da época.

Essas influências modernas Paulo Ricardo trouxe de Londres. Passou seis meses na terra da Rainha, em 1983, vendo shows de bandas então iniciantes, como Depeche Mode, Culture Club, Spandau Ballet, Echo & The Bunnymen... Foi vendo essas bandas que começou a delinear o ainda não batizado RPM. De Londres, começou a se corresponder com o Schiavon (lembra que já existiu um negócio chamado carta?), explicando a ligação da guitarra com o tecnopop e o new romantic.

O RPM logo causou pânico no underground paulistano, em casas como Madame Satã, Raio Lazer e Tiffon. Chegaram a ser banda residente no Satã. O RPM acabou se consolidando no underground, recebendo críticas entusiasmadas de vários jornalistas culturais respeitados na época. Poucas bandas usavam os teclados da maneira que eles, encurtando o abismo entre o progressivo e o pop. O set, mesmo curto, era puxado para o underground e muitas pessoas definiam o som do RPM na época como “um meio caminho entre Echo & The Bunnymen e Gang Of Four”.

E Revoluções Por Minuto é realmente muito bom. Tem a depressão em "Juvenilia", o rock em "A fúria do sexo frágil contra o dragão da maldade", "Estação no inferno", a agonia de "A cruz e a espada". Em seguida, lançaram um disco ao vivo, o famigerado Rádio pirata ao vivo, que vendeu milhões, causou histeria coletiva e o escambau.

Foi o primeiro disco de uma banda brasileira de rock a vender mais de um milhão de cópias. Em 1986, era item obrigatório em quase todos os lares brasileiros. De acordo com a Sony, detentora dos direitos da antiga CBS, de 86 até hoje o disco vendeu mais de 2,7 milhões de cópias. A febre fez com que o grupo iniciasse uma turnê de 15 meses ininterruptos. A estafa da estrada causou um abalo nas relações entre os quatro. Abalo que durou até o ano passado, quando tentaram mais uma volta - e enterraram, de vez, qualquer aura cult que o nome RPM poderia ter.

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