quarta-feira, 8 de abril de 2009

ESPECIAL ANIVERSÁRIO DE FORTALEZA: ARTIGOS DE PERSONALIDADES


FORTALEZA SEM ROSTO

A Praça do Ferreira foi concebida em 1842 para substituir a Praça da Carolina, onde ficava o Mercado de Ferro (no atual espaço dos Correios, Bando do Brasil e Palácio do Comércio).
Teve diversos nomes, como Feira Nova, Beco do Cotovelo, Largo das Trincheiras, Praça Pedro 11 e, a partir de 1851, Praça do Ferreira (quando do falecimento do Boticário Ferreira). O nome só foi oficializado 20 anos depois.
A principio era somente um areal com uma cacimba no centro e, posteriormente, um cajueiro no lado da Floriano Peixoto. Sua primeira planta (de Adolf Herbster) data de 1859.
Em 1886, surgiu o primeiro café, o Java, de Manoel Ferreira dos Santos, o "Mané Côco". Nele, em 1892, foi finda a badalada "Padaria Espiritual" (movimento supermodernista que antecedeu em 30 anos a também badalada Semana da Arte Moderna, de São Paulo, em 1922). A propósito, segundo análise feita á revista Veja, de 27 de setembro de 1995, pelo respeitado historiador Nelson Werneck Sodré, "o movimento modernista é muito menos do que se apregoa. A Semana de 1922 foi organizada com apoio oficial. Foi uma brincadeira do pintor Di Cavalcanti. O principal colaborador foi Oswald de Andrade, um magnífico autor de blagues que, como escritor, obra importante não deixou". Apesar desta constatação, a mídia continua alardeando a "importância" da Semana da Arte Moderna.
Voltando à fisionomia da Praça do Ferreira: em cada canto do areal havia um café: Java, Iracema, Do Comércio e Elegante.
Em 1902, ao ajardinar a Praça do Ferreira, o intendente Guilherme Rocha mandou fechar a cacimba. O tal jardim chamou-se "7 de setembro
De 1904 a 1920, era costume afixarem-se os nomes dos políticos enganadores (os verborrágicos) e dos comerciantes inadimplentes no tronco do cajueiro da Praça, o qual ficou conhecido como "Cajueiro da Mentira". Atualmente, do jeito que as coisas ficaram, tornou-se imperativo que cada bairro tenha o seu "Cajueiro da Mentira".
Em 1920, quando o Prefeito Godofredo Maciel ladrilhou a praça, além de demolir os quatro cafés, convenientemente ordenou que se pusesse abaixo aquele cajueiro denunciador de falcatruas. Em 1925, Maciel mandou construir um coreto para bandas de música
Em 1933, o Prefeito Raimundo Girão mandou derrubar o coreto e em seu lugar erguer a Coluna da Hora que, por sua vez, também seria demolida em 1968, pelo Prefeito José Walter. Em 1991, Juracy Magalhães mandou que se erguesse (no mesmo local) uma imitação tupiniquim da tal Coluna da Hora.
Como se vê, Fortaleza não tem rosto arquitetônico, posto que, de tempos em tempos, sua fisionomia é alterada, a fim de atender não a melhoria de vida de seus habitantes, e sim aos interesses dos que querem enriquecer derrubando e construindo prédios públicos Para lembrá-los ficam somente as fotos antigas, quando conservadas.
Este procedimento irresponsável dos nossos homens públicos (enganando a população, dizendo que assim agem em nome da "modernidade" é que é a causa da destruição de nosso patrimônio histórico-arquitetônico. E isto vem acontecendo em todas as cidades brasileiras (numas mais, noutras menos). Em qualquer capital européia há a parte nova e a parte antiga. Aqui, não: aqui, o antigo é sinônimo de velharia, enquanto que na Europa, é cultura.
O mesmo engenheiro-arquiteto que, lá faz questão de ser fotografado ao lado de um prédio centenário, se fosse aqui, ele mandaria por abaixo, taxando-o de "velharia ultrapassada".
Desse mesmo modo também agem os herdeiros dos personagens ilustres de nossa terra, destruindo seus patrimônios arquitetônicos sob a alegação de falta de dinheiro para pagar os impostos Como se vê, a depredação é total.
Assim foi que consentiram em destruir, em 1938, a Igreja da Sé (terminada em 1854) alegando que suas paredes estavam rachadas. A ironia é que a ordem da demolição partiu do próprio Arcebispo de Fortaleza, o baiano Dom Manoel da Silva Gomes, o qual haveria de se arrepender amargamente deste seu impensado ato (segundo suas próprias palavras).
Destruíram a Fênix Caixeiral, o Museu Histórico (que ficava na esquina da Praça Caio Prado, popularmente chamada de Praça da Sé, pertinho de minha casa, onde na minha infância e adolescência eu ia beber História); o Palácio do Plácido na Aldeota, a Casa de Rodolpho Theóphilo, o Cine Moderno e o Abrigo Central (na Praça do Ferreira), o mini-sitio Itapuca, da família Salgado (em Jacarecanga), o Pavilhão Atlântico (na entrada da Ponte Metálica, na Praia de Iracema). Desfiguraram a Praça Visconde de Pelotas (comumente chamada de Praça da Bandeira e,hoje, Praça Clóvis Beviláqua e o Passeio Público.
Há sete anos puseram abaixo casas e árvores centenárias da Avenida Alberto Nepomuceno (inclusive o casarão sobrado em que se criou, desde um ano de idade Dom Helder Câmara para a construção dessa horripilância arquitetônica a que deram o pomposo nome de Marcado Central, cuja estrutura (em algumas partes) já está comprometida. O mesmo aconteceu à algumas residências defronte à Igreja da Prainha, a fim de se construir uma imitação tupiniquim do Centro Pompidou, de Paris, chamando-o de Centro Cultural Dragão do Mar, sala de visitas para os artistas de fora, enquanto os de Fortaleza são marginalizados. E isto, apesar de o mesmo haver sido construído com o dinheiro dos fortalezenses.
As próprias praias de Fortaleza foram destruídas O fortalezense é um praiano que não tem praia. Antigamente, havia uma Lei do Código de Postura que proibia a construção de qualquer edificação na orla marítima com mais de três andares. Isto só durou até surgir a especulação imobiliária. Puseram a tal Lei abaixo (em nome da modernidade) criando outra que permitia a construção de edifícios de apartamentos ria orla marítima. Estes espigões de cimento armado tiraram toda a amenidade do clima de Fortaleza.
O pior de tudo é constatar, com tristeza, que nossos "historiadores" batem palmas para este tipo de vilania que alimenta cada vez mais, seu "complexo de Caramuru".
Se lêssemos enumerar tudo o que já foi destruído (ou está para sê-lo) este artigo-denúncia viraria um livro. Alguns estão lucrando com tudo isto... a população é que não... Aliás, no Brasil, 3% da população não tem do que reclamar, enquanto os outros 97% não têm a quem reclamar...
Na realidade, o que os políticos têm feito, ao longo dos anos, é modernizar a miséria. Amazônia que se cuide com estes entreguistas, perto dos quais, Al Capone e seus asseclas são aprendizes...


Christiano Câmara - Pesquisador e Historiador

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